Carnaval 2023: Mangueira vai levar o protagonismo negro de volta para a Sapucaí em enredo sobre as Áfricas que a Bahia canta

A Estação Primeira de Mangueira encerrou uma expectativa que já durava havia sete dias, quando anunciou nas redes sociais que tinha definido o enredo que levará para a Avenida em 2023. O mistério chegou ao fim no começo da tarde desta segunda-feira: a verde e rosa anunciou que vai voltar a levar para a Sapucaí uma narrativa de protagonismo negro com o tema “As Áfricas que a Bahia canta”, que será desenvolvido pela dupla de carnavalescos Annik Salmon e Guilherme Estevão, oriunda da Série Ouro, antigo Grupo de Acesso, e recém-contratada após a ida de Leandro Vieira para a Imperatriz Leopoldinense, que na sexta-feira também divulgou seu enredo.

A intenção da verde e rosa é mostrar as construções das visões de África na Bahia a partir de sua musicalidade e instituições carnavalescas negras, destacando o protagonismo feminino nesse processo e as lutas contra intolerância, racismo e pelo fortalecimento da identidade afrobrasileira. Segundo a escola, serão abordadas, entre outros temas, passagens da história preta do carnaval pouco difundidas nas construções cronológicas da festa, com os cortejos pré e pós abolição da escravatura, como os cucumbis e clubes negros, resgatando saberes e práticas ancestrais, as lutas pela inserção e reconhecimento da cultura afrobrasileira carnavalesca.

Também serão mostrados os embates contra intolerância religiosa e racial dos Afoxés; as denúncias de desigualdade social pela arte dos blocos afros; a expansão da afrobaianidade pelos cantares do axé. Ainda segundo a escola, todos esses processos serão conduzidos com protagonismo por mulheres pretas, mães, deusas, rainhas que usaram suas “corpas” e vozes contando, louvando e cantando para e por seu povo.

— Nós apostamos em um enredo que carregasse uma série de aspectos que mobilizam muito o mangueirense. Um tema baseado em uma narrativa de arte e luta preta, reafirmando a veia musical de carnavais da verde e rosa, destacando o caráter feminino da escola e namorando a baianidade como só a Mangueira faz. Discutindo questões importantes pela alegria — explicou o carnavalesco Guilherme Estevão, que esteve à frente dos dois últimos carnavais da Império da Tijuca até se transferir para a Mangueira.

Annik Salmon explicou que o enredo vai mostrar que a musicalidade baiana tem origem na trajetória do negro africano:

— Quando eu e Guilherme fomos convidados para sermos os carnavalescos da Mangueira, nós dois levamos uma temática a qual queríamos abordar, que é essa questão preta e africana na formação do nosso Brasil. Então, quando a gente fala da musicalidade baiana, que tem toda sua origem e trajetória no negro africano, a gente exalta essa cultura, essa raça que é a formação do nosso povo e que muitas vezes tentaram apagar. E trazendo essa temática para o carnaval, nós mostramos a importância de sermos pretos, de nos valorizarmos. O negro muitas vezes foi visto como objeto de estudo. Mas hoje , nós somos os protagonistas dessa história., contando, cantando e exaltando nossas origens — explicou a carnavalesca, responsável pelo desfile vice-campeão da Porto da Pedra, em 2022, pela Série Ouro.

No desfile desse ano, realizado em abril, por conta da pandemia, a Mangueira homenageou Cartola, Jamelão e Delegado, três ícones da verde e rosa. A escola ficou em sétimo lugar e fora do Desfile das Campeãs.

Outros enredos definidos

Entre as escolas que já definiram o enredo para o carnaval de 2023 está a Imperatriz Leopoldinense, que neste domingo apresentou sua nova equipe durante a tradicional feijoada mensal, na quadra em Ramos. A verde e branca vai mostrar na Avenida o universo nordestino de Virgulino Ferreira da Silva sob o olhar da literatura popular, com referências ao cangaço e tradições estéticas e musicais do sertão, no enredo “O aperreio do cabra que o excomungado tratou com má-querença e o santíssimo não deu guarida”..

— O enredo se debruça na “peleja” inverossímil e delirante dos cordelistas que, após a morte do cangaceiro Virgulino Ferreira da Silva – o famoso Lampião -, transformaram em jocoso, ficcional e rica literatura o destino pós-morte da mítica personalidade nordestina — diz o carnavalesco, acrescentando que a inspiração veio dos populares livretos escritos em verso, típicos da cultura nordestina, como “A chegada de Lampião no inferno”, “O grande debate que teve Lampião com São Pedro” e “A chegada de Lampião no céu”.

Campeã do Grupo Especial em 2022, a Grande Rio foi a primeira a definir o enredo. A escola de Duque de Caxias quer conquistar o bicampeonato contando a história do portelense Zeca Pagodinho, com os carnavalescos Leonardo Bora e Gabriel Haddad. A Portela, por sua vez, contará a sua própria história para celebrar o centenário da escola de Madureira.

De volta ao Grupo Especial, o Império Serrano escolheu o sambista Arlindo Cruz como grande homenageado. Ainda que o anúncio não tenha sido feito oficialmente, já circulam fotos dele e da mulher Babi Cruz com o carnavalesco Alex de Souza.

Já a Viradouro vai levar para a Sapucaí um enredo sobre a vida e a obra de Rosa Courana, ou Rosa Maria Egipcíaca da Vera Cruz, considerada a primeira mulher negra a escrever um livro no Brasil. Quem vai construir essa história é o carnavalesco Tarcísio Zanon.