Covid-19: Paes rebate críticas de Bolsonaro e diz que quer continuar vacinando adolescentes: ‘Não dialogo com a morte’

A Prefeitura do Rio comunicou nesta sexta-feira que continuará vacinando adolescentes contra a Covid-19 apesar da mudança de orientação do Ministério da Saúde — o que ainda depende, contudo, da entrega de mais doses de vacina. Além disso, durante a entrevista coletiva de divulgação do 37° boletim epidemiológico da cidade do Rio, o prefeito Eduardo Paes rebateu as críticas do presidente Bolsonaro sobre a exigência de comprovante de vacinação para servidores municipais.

Em uma live na noite de ontem, o presidente Bolsonaro atacou Paes pelo decreto municipal, chegando a chamá-lo de ditador. Nesta sexta-feira, o prefeito exibiu o vídeo da declaração do presidente durante a coletiva e em seguida rebateu as falas, dizendo que “o que move é a proteção à vida dos servidores”. Ele também sugeriu que o presidente “dialoga com a morte” e, no caso da suspensão da vacinação de adolescentes, interferiu na decisão do Ministério da Saúde que era de natureza técnica.

— Ontem, o ministro da Saúde e o presidente da República, em uma dessas livres do presidente, introduziram esse tema da vacinação de adolescentes. E obviamente, o que é uma característica do nosso presidente da República, com agressões a gestores públicos, eleitos, no nível municipal e estadual, e objetivamente me citou, em dado momento. Tenho tentado desde o início da pandemia não politizar a Covid por uma série de razões. E tentarei continuando não fazê-lo, mas não posso deixar de comentar a fala do presidente ontem. A prefeitura vai ter que ter uma posição clara em relação a algumas medidas, e aí é a minha posição política, com base no que leio na imprensa e da própria Anvisa. O que respondo ao presidente com muito respeito e formalidade ao presidente da República é que não dialogo com a morte. O que tem nos movido aqui permanentemente é o amor à vida. — afirmou o prefeito. — O que me move aqui é a solidariedade com todas as famílias enlutadas do país. Não sei se o presidente tem capacidade de se sensibilizar com isso.

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Paes lembrou ainda as famílias que, no contexto da pandemia, passaram por percalços financeiros.

— Temos famílias enlutadas, como é o caso da minha, mas também temos famílias que perderam suas condições de sobrevivência (financeira). O que respondo ao presidente, sem politizar algo que na minha opinião não deve ser politizado, é que o que vai nos mover aqui é a paixão pela vida, o respeito aos servidores. Nós não dialogaremos com a morte na cidade do Rio.

Ele disse ainda que, “no que depender de mim, o Rio continua a vacinar adolescentes”, mas ressaltou que essa decisão é técnica e será tomada pela Secretaria municipal de Saúde junto ao comitê científico do Rio:

— Minha opinião é que a cidade do Rio, no que depender de mim, vamos, sim, continuar vacinando adolescentes até 12 anos de idade. Vamos, sim, continuar aplicando a segunda dose nos adolescentes que já tomaram a primeira dose. Vamos, sim, continuar dando dose de reforço para idosos. E vamos, sim, se necessário, continuar aplicando vacina no ano que vem.

Entenda

Na live desta quinta-feira, Bolsonaro criticou Paes por um decreto municipal que prevê punições e até demissão para o servidor da prefeitura que se recusar a tomar a vacina contra a Covid.

— Você tem o caso do prefeito do Rio de Janeiro obrigando o servidor público a tomar a vacina. Eduardo Paes, tomar CoronaVac, tem alguma comprovação científica a CoronaVac? Como você tem prova disso? Que maldade é essa? São alguns dos projetos de ditadura do Eduardo Paes. E vimos muitos governadores fazendo coisas terríveis na pandemia, toque de recolher, confinamentos, entre outras barbaridades — afirmou o presidente.

Ele estava ao lado do ministro Marcelo Queiroga, que na quarta-feira disparou aos municípios uma nota técnica que suspende a vacinação de adolescentes. A decisão teve como pano de fundo a morte de um menor vacinado com o imunizante da Pfizer em São Paulo — episódio que, na avaliação da Anvisa, não tem relação causal com o fato de o adolescente ter sido imunizado, segundo investigação ainda em curso. A vacina da Pfizer foi autorizada para uso em menores em diversos países e recebeu o aval da agência sanitária com base em estudos que comprovam a segurança de sua aplicação nesse público.

nota técnica foi tema de uma entrevista coletiva do Ministério da Saúde nesta quinta-feira, em que Queiroga criticou os gestores locais que já tinham aplicado doses em adolescentes. Como o EXTRA mostrou, a nova determinação da Saúde aconteceu após um questionamento de Bolsonaro.

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O secretário municipal de Saúde, Daniel Soranz, definiu a coletiva de ontem como “a pior da História do Ministério da Saúde”. E sugeriu que as justificativas do órgão federal para a decisão não mencionam o motivo real da suspensão da vacinação de adolescentes: a falta de vacina.

— A coletiva de ontem entrou para a História como a pior que poderia ser dada em relação à vacina. Foi muito grave — disse Soranz. — A gente sabe que essa nota técnica resultou de uma decisão externa ao Ministério da Saúde. Não foi de nenhum técnico do ministério. E culminou em mais uma crítica nacional a todos os secretários que vacinaram adolescentes, colocando em risco o Sistema Único de Saúde, o Programa Nacional de Imunizações, gerando suspeitas e dúvidas em relação à vacinação, e nunca, na História do país, um ministro da Saúde falou para as pessoas não procurarem um posto para se vacinar. Na contramão de todo mundo e de nossa própria História.

Segundo o secretário, embora a nota técnica careça de fundamentação científica, a prefeitura manterá a reunião marcada com o Comitê Científico de Enfrentamento à Covid-19 (CEEC) da cidade para discutir o assunto, a fim de “reforçar” a necessidade de vacinar os adolescentes. A reunião está programada para a próxima quarta-feira.

— Fomos surpreendidos ontem, não só o Rio de Janeiro mas todos os secretários municipais de Saúde, com uma nota técnica do ministério das mais absurdas possíveis. Uma nota que não corresponde à verdade, já que a vacina da Pfizer é segura para adolescentes e utilizada em diversos países do mundo. Não vejo nenhuma fundamentação científica, nem eu nem nenhuma das principais instituições científicas do país, para cancelar essa vacinação a partir de efeitos adversos. A nota também não diz a verdade a respeito da Organização Mundial da Saúde, que recomenda, sim, a vacinação de adolescentes. Ela suspende a vacinação desse público com uma intenção que ela não explicita — afirmou. — A Saúde demorou para adquirir as vacinas, demorou para assinar o contrato com a Pfizer, assinou o contrato aquém do que deveria ter assinado, e, no momento, falta vacina. A desculpa dessa nota técnica, numa comunicação totalmente desorganizada, não se aplica. O que se aplica é a falta de vacina e quais serão as prioridades entre as pessoas que vão tomar vacina nos próximos dias.

No município, a continuidade da vacinação de adolescentes depende de entregas de mais doses de Pfizer, único imunizante autorizado para aplicação nesse público. A exceção são os meninos de 14 anos, que se vacinam nesta sexta-feira. A imunização dos grupos de 12 e 13 anos, segundo Soranz, só pode acontecer caso o Ministério da Saúde entregue as doses da vacina em estoque, o que deve acontecer até terça-feira.

— É inadmissível ter vacinas no estoque do Ministério da Saúde levando dias para serem liberadas. Segurar doses em estoque é criminoso. Não se pode fazer isso no meio de uma pandemia — disse Soranz.